segunda-feira, 9 de julho de 2012

UM PORTAL PARA O CRESCIMENTO


Estamos rodeados por todos os lados de uma estranha mistura de verdade e ilusão. A lei da vida estabelece que a ilusão é uma tinta ou camuflagem cuja função é encobrir a verdade apenas de quem não está pronto para ela. E muitos poucos estão. Por isso o bom discernimento é um instrumento de trabalho absolutamente essencial, que aprendemos a manejar lenta e gradualmente, na longa busca do equilíbrio interior e da felicidade.

De fato, só pode haver sabedoria se formos capazes de distinguir o que é verdadeiro do que é falso.

E não basta diferenciar um do outro intelectualmente. É preciso também optar de fato pelo verdadeiro. Renunciar à falsidade e ao erro é difícil,  especialmente quando eles são agradáveis a curto prazo ou constituem opções mais fáceis e automáticas. Por isso, subconscientemente, gostamos de alimentar ilusões e boicotamos nossos próprios esforços para encontrar a verdade.

Todo ser humano saudável busca diminuir a quantidade de ilusões em sua vida. Mas nem sempre ele tem força para avançar com rapidez e dizer: “Bem-vindas as desilusões!” O apego às mentiras que armamos para nós mesmos é tão grande que alguém costumava rezar todas as noites do seguinte modo: “Ó Deus, dê-me pureza e honestidade,... mas não agora.” Para alguns, as palavras “mas não agora” nem precisam ser ditas. Ficam implícitas em suas orações.

Queremos viver com sabedoria, mas nem sempre estamos dispostos a abandonar a ignorância. A cada verdade que descobrimos, surge uma desilusão de igual tamanho, para a qual podemos não estar preparados.

Queremos abrir espaço para a verdade, mas as ilusões são coisas vivas e se comportam como parasitas inteligentes que não gostam de ser ignorados. A maldade sempre fica ofendida pelo que é bom, e costuma causar grandes tempestades nas ocasiões em que se sente abandonada.

Quando se trata de verdades pequenas, é mais fácil mantê-las a uma distância segura da prática e evitar uma crise. Uma boa dose de ingenuidade e crença cega pode nos ajudar a fazer isso. Mas reexaminar os alicerces da nossa estratégia de vida, buscando apenas a verdade, causa surpresas. É como caminhar sem muletas. Requer doses mais altas de coragem.
Somos seres incompletos e “em construção”. Para nós, portanto, a verdade não é apenas algo pronto e acabado. Ela é também um projeto para o futuro, uma semente, algo que devemos criar com a força decidida da nossa vontade. O terreno em que avançamos é incerto e tudo na vida pode ser enganoso. As fronteiras entre sonho, verdade, fantasia e ilusão não estão bem demarcadas.

Talvez possamos dizer que a diferença entre o sonho e a ilusão é que o sonho tem uma chance real de ocorrer, dependendo do nosso esforço e do nosso talento, e a ilusão é apenas uma fuga da realidade. Mas como diferenciar na prática os dois? Quantos sonhos se revelam ilusões depois de duros esforços feitos durante muito tempo?

E quantas coisas consideradas impossíveis se tornaram realidade? Também é errado pensar que os nossos sonhos perdidos foram apenas ilusões. Do ponto de vista da ciência esotérica, não há esforço perdido. Cada tentativa feita tem um efeito positivo - proporcional à sua intensidade - na direção desejada.

Assim, um esforço aparentemente perdido no plano visivel da vida é, no mínimo, uma preparação para uma vitória mais adiante, nesta existência ou não. A vida é complexa e nada pode ser visto de um único ponto de vista. O erro e o acerto estão quase sempre misturados nas situações imediatas. O que podemos fazer, se tivermos suficiente honestidade, é diminuir a ilusão e aumentar a margem de acerto nos diferentes aspectos da nossa vida.

Viver corretamente é um desafio enorme porque não há limites fáceis e óbvios entre realidade e ilusão. As tentativas de demarcar externamente a verdade trazem consigo o processo duplo de ilusão e desilusão.

Os sistemas ideológicos, políticos, religiosos e científicos que ainda são primários e estreitos apresentam sua descrição da verdade e dizem: “Este é o caminho para a verdade e a felicidade. Nosso discurso é autêntico. Fora destes limites estão a mentira e a ilusão.”

Esses esquemas de referências nos oferecem um certo sentimento de certeza e segurança, mas podem tentar colocar-nos uma venda nos olhos para que não enxerguemos outras coisas, que questionariam a crença central. Em cada ideologia - e as ideologias são coisas antigas - parece haver a possibilidade de esquecer um fato essencial: Que a verdade é um processo aberto, ao mesmo tempo mutável e eterno, sempre surpreendente, nunca controlável por sistemas burocráticos de crença organizada.
No terceiro milênio, esse fato básico será reconhecido universalmente. Naturalmente, não é possivel caminhar até a verdade com muletas. Tampouco podemos alcançá-la sem tropeços, tombos e arranhões. Se a vida não se encarregasse de causar desilusões, não cresceríamos. Pode ser uma pessoa em quem confiávamos e que nos decepcionou, ou alguém que inconscientemente considerávamos imortal e a vida arrancou de nós. A decepção pode ser com nós mesmos ou com um colega de trabalho.

Pode ser com um técnico de futebol ou um político. Quando não há muletas, os tombos fazem parte da caminhada. Quem tiver forças receberá com um sorriso as decepções e desenganos. O desafio de deixar que caiam as máscaras e aparências falsas está diante de nós em tudo o que fazemos, inclusive no caminho do auto-conhecimento espiritual.

Há ilusões de todo tipo. Algumas delas são pessimistas, outras otimistas. É fundamental porém, ter sempre claro que pessimismo nada tem a ver com realismo. De fato, as piores ilusões são as que levam ao desânimo. Porque é mais facil cair na realidade vindo de um exagero otimista do que voltar à realidade saindo do poço do pensamento negativo.

Portanto, é melhor errar por exagerar o lado bom do que errar por exagerar o lado mal das coisas.

Há ilusões coletivas que pairam no ar e podemos absorver inconscientemente. São falsidades culturais mais ou menos estabelecidas, que é possível identificar e rejeitar. Vejamos alguns exemplos práticos:

1-“Há apenas paz e amor no caminho espiritual”. 

O zen-budista Shundo Aoyma escreveu: “O nascimento, a velhice, a doença e a morte, assim como a felicidade, a infelicidade, o ganho e a perda, todos esses fatores são instrumentos importantes para construir o tecido da vida humana. Uma vida não pode ser construída apenas com a cor da felicidade.”Esta é uma lei infalivel.

2-“Temos a obrigação de experimentar sempre sentimentos maravilhosos durante nossas meditações.” 

Na verdade, como ensinou Charlotte Joko Beck, “a meditação não é ocasião para bem-aventurança e relaxamento, mas um forno para queimar as nossas ilusões egoístas”.

Quando sentamos, imóveis, para buscar a verdade interior, podemos ser assaltados por dúvidas, ansiedades e outros movimentos da ignorância. Dessa tensão surgem um atrito e um fogo que queimam as ilusões do nosso eu pessoal, tornando-o digno de contemplar a verdade. Assim, a perseverança é essencial para que a meditação produza a mudança.

3-“A caminhada espiritual é apenas pessoal e subjetiva, nada tendo a ver com os outros ou com o mundo externo”.

O monge zen Thich Nhat Hanh considera que “os instrutores espirituais que não dão atenção aos problemas do mundo, como fome, guerra, opressão e injustiça social, não compreenderam bem o significado do budismo mahayama.” Naturalmente devemos praticar a atenção na respiração, a meditação e o estudo das escrituras, mas qual é o sentido de fazer estas coisas? É estar atento ao que ocorre dentro de nós e no mundo. O que ocorre no mundo também ocorre dentro de nós, e vice-versa.

Uma vez que vejamos isso claramente, não nos recusaremos a tomar posição ou a agir. Se não pudermos ver o que está ocorrendo ao nosso redor, como poderemos enxergar nossa própria natureza? Há uma relação entre a natureza do eu e a natureza do sofrimento, da injustiça e da guerra'.

4- “Nossos pensamentos e emoções são independentes e separados do nosso corpo físico”.

Na verdade, nossas emoções e pensamentos se refletem o tempo todo no modo como a energia física e vital passa por nosso corpo. A alimentação, a respiração, a circulação do sangue, o trabalho do rim e do fígado, os relaxamentos e tensões são retratos dinâmicos que expressam no plano físico o que vai em nossa alma. As posturas e processos corporais, por sua vez, tem forte influência sobre nossas atitudes mentais e emocionais. Você pode fazer uma experiência prática e comprovar isso neste exato momento. Faça uma pausa. Erga os braços com as mãos fechadas, sem tensão, um pouco acima dos ombros e as leve para trás o mais possível, sem que haja desconforto. A sua coluna vertebral ficará comodamente ereta. Ao mesmo tempo, respire de  modo suavemente profundo. Feche os olhos, repetindo lenta e amorosamente, com meio sorriso nos lábios, a seguinte frase: “Eu estou em sintonia com a paz do universo”. Há uma relação direta entre a postura do tórax e os estados de consciência.

Os ombros abertos e a respiração profunda dão confiança em si mesmo e na vida. Depois de alguns minutos, encerre o exercício e observe o fluxo da sua energia vital, física, emocional e mental. Notará uma diferença.
5-“O caminho espiritual é feito de fé e crença.”

Grave engano. A crença em algo que não podemos verificar por nós mesmos  reduz a nossa capacidade de perceber a realidade e fecha nossa mente para o que é novo. O caminho espiritual é feito de perguntas e tentativas. A convicção é um péssimo critério para julgar a verdade.

Os autoritarismos, religiosos ou não, plantam falsas certezas e exigem “fé” e “confiança” dos seus seguidores. Os sistemas corretos de liderança, baseados na democracia e na comunhão fraterna, fazem da transparência, do controle e da vigilância coletiva a sua característica central.

A verdadeira fé surge de dentro para fora, não é resultado de propaganda ou pregação, e não tem medo do exame crítico, mas, ao contrário, testa sua própria força enfrentando de boa vontade os desafios da vida.

Muitos outros exemplos de ilusão podem ser encontrados na vida dentro e fora de nós. Na verdade, o caminho espiritual é apenas o modo como cada um de nós decide, livremente, aceitar o desmonte das suas ilusões e adequar sua vida prática à lei eterna do equilíbrio e da verdade. A sabedoria espiritual não é um dogma em que se deve acreditar, mas uma ciência prática a aplicar no laboratório da nossa vida diária, à medida que a ignorância é dolorosamente reconhecida como tal. Felizmente há uma grande bênção escondida em cada desilusão, e um alívio maior nasce, sempre, de cada sofrimento nosso.

"A DESILUSÃO É O ENCONTRO COM A VERDADE"

(Esse texto não é meu, mas desconheço o autor do mesmo)