Estamos
rodeados por todos os lados de uma estranha mistura de verdade e ilusão. A lei
da vida estabelece que a ilusão é uma tinta ou camuflagem cuja função é encobrir
a verdade apenas de quem não está pronto para ela. E muitos poucos estão. Por
isso o bom discernimento é um instrumento de trabalho absolutamente essencial, que
aprendemos a manejar lenta e gradualmente, na longa busca do equilíbrio
interior e da felicidade.
De
fato, só pode haver sabedoria se formos capazes de distinguir o que é
verdadeiro do que é falso.
E
não basta diferenciar um do outro intelectualmente. É preciso também optar de
fato pelo verdadeiro. Renunciar à falsidade e ao erro é difícil, especialmente quando eles são agradáveis a
curto prazo ou constituem opções mais fáceis e automáticas. Por isso, subconscientemente,
gostamos de alimentar ilusões e boicotamos nossos próprios esforços para
encontrar a verdade.
Todo
ser humano saudável busca diminuir a quantidade de ilusões em sua vida. Mas nem
sempre ele tem força para avançar com rapidez e dizer: “Bem-vindas as
desilusões!” O apego às mentiras que armamos para nós mesmos é tão grande que
alguém costumava rezar todas as noites do seguinte modo: “Ó Deus, dê-me pureza
e honestidade,... mas não agora.” Para alguns, as palavras “mas não agora” nem
precisam ser ditas. Ficam implícitas em suas orações.
Queremos
viver com sabedoria, mas nem sempre estamos dispostos a abandonar a ignorância.
A cada verdade que descobrimos, surge uma desilusão de igual tamanho, para a
qual podemos não estar preparados.
Queremos
abrir espaço para a verdade, mas as ilusões são coisas vivas e se comportam
como parasitas inteligentes que não gostam de ser ignorados. A maldade sempre
fica ofendida pelo que é bom, e costuma causar grandes tempestades nas ocasiões
em que se sente abandonada.
Quando
se trata de verdades pequenas, é mais fácil mantê-las a uma distância segura da
prática e evitar uma crise. Uma boa dose de ingenuidade e crença cega pode nos
ajudar a fazer isso. Mas reexaminar os alicerces da nossa estratégia de vida,
buscando apenas a verdade, causa surpresas. É como caminhar sem muletas. Requer
doses mais altas de coragem.
Somos
seres incompletos e “em construção”. Para nós, portanto, a verdade não é apenas
algo pronto e acabado. Ela é também um projeto para o futuro, uma semente, algo
que devemos criar com a força decidida da nossa vontade. O terreno em que
avançamos é incerto e tudo na vida pode ser enganoso. As fronteiras entre
sonho, verdade, fantasia e ilusão não estão bem demarcadas.
Talvez
possamos dizer que a diferença entre o sonho e a ilusão é que o sonho tem uma
chance real de ocorrer, dependendo do nosso esforço e do nosso talento, e a
ilusão é apenas uma fuga da realidade. Mas como diferenciar na prática os dois?
Quantos sonhos se revelam ilusões depois de duros esforços feitos durante muito
tempo?
E
quantas coisas consideradas impossíveis se tornaram realidade? Também é errado
pensar que os nossos sonhos perdidos foram apenas ilusões. Do ponto de vista da
ciência esotérica, não há esforço perdido. Cada tentativa feita tem um efeito
positivo - proporcional à sua intensidade - na direção desejada.
Assim,
um esforço aparentemente perdido no plano visivel da vida é, no mínimo, uma preparação
para uma vitória mais adiante, nesta existência ou não. A vida é complexa e
nada pode ser visto de um único ponto de vista. O erro
e o acerto estão quase sempre misturados nas situações imediatas. O que podemos
fazer, se tivermos suficiente honestidade, é diminuir a ilusão e aumentar a
margem de acerto nos diferentes aspectos da nossa vida.
Viver
corretamente é um desafio enorme porque não há limites fáceis e óbvios entre
realidade e ilusão. As tentativas de demarcar externamente a verdade trazem
consigo o processo duplo de ilusão e desilusão.
Os
sistemas ideológicos, políticos, religiosos e científicos que ainda são
primários e estreitos apresentam sua descrição da verdade e dizem: “Este é o
caminho para a verdade e a felicidade. Nosso discurso é autêntico. Fora destes
limites estão a mentira e a ilusão.”
Esses
esquemas de referências nos oferecem um certo sentimento de certeza e
segurança, mas podem tentar colocar-nos uma venda nos olhos para que não
enxerguemos outras coisas, que questionariam a crença central. Em cada
ideologia - e as ideologias são coisas antigas - parece haver a possibilidade
de esquecer um fato essencial: Que a verdade é um processo aberto, ao mesmo
tempo mutável e eterno, sempre surpreendente, nunca controlável por sistemas burocráticos
de crença organizada.
No
terceiro milênio, esse fato básico será reconhecido universalmente. Naturalmente,
não é possivel caminhar até a verdade com muletas. Tampouco podemos alcançá-la
sem tropeços, tombos e arranhões. Se a vida não se encarregasse de causar
desilusões, não cresceríamos. Pode ser uma pessoa em quem confiávamos e que nos
decepcionou, ou alguém que inconscientemente considerávamos imortal e a vida
arrancou de nós. A decepção pode ser com nós mesmos ou com um colega de
trabalho.
Pode
ser com um técnico de futebol ou um político. Quando não há muletas, os tombos
fazem parte da caminhada. Quem tiver forças receberá com um sorriso as
decepções e desenganos. O desafio de deixar que caiam as máscaras e aparências
falsas está diante de nós em tudo o que fazemos, inclusive no caminho do auto-conhecimento
espiritual.
Há
ilusões de todo tipo. Algumas delas são pessimistas, outras otimistas. É
fundamental porém, ter sempre claro que pessimismo nada tem a ver com realismo.
De fato, as piores ilusões são as que levam ao desânimo. Porque é mais facil
cair na realidade vindo de um exagero otimista do que voltar à realidade saindo
do poço do pensamento negativo.
Portanto,
é melhor errar por exagerar o lado bom do que errar por exagerar o lado mal das
coisas.
Há
ilusões coletivas que pairam no ar e podemos absorver inconscientemente. São
falsidades culturais mais ou menos estabelecidas, que é possível identificar e
rejeitar. Vejamos alguns exemplos práticos:
1-“Há
apenas paz e amor no caminho espiritual”.
O zen-budista Shundo Aoyma escreveu: “O nascimento, a velhice, a doença e a morte, assim como a felicidade, a infelicidade, o ganho e a perda, todos esses fatores são instrumentos importantes para construir o tecido da vida humana. Uma vida não pode ser construída apenas com a cor da felicidade.”Esta é uma lei infalivel.
O zen-budista Shundo Aoyma escreveu: “O nascimento, a velhice, a doença e a morte, assim como a felicidade, a infelicidade, o ganho e a perda, todos esses fatores são instrumentos importantes para construir o tecido da vida humana. Uma vida não pode ser construída apenas com a cor da felicidade.”Esta é uma lei infalivel.
2-“Temos
a obrigação de experimentar sempre sentimentos maravilhosos durante nossas
meditações.”
Na verdade, como ensinou Charlotte Joko Beck, “a meditação não é ocasião para bem-aventurança e relaxamento, mas um forno para queimar as nossas ilusões egoístas”.
Na verdade, como ensinou Charlotte Joko Beck, “a meditação não é ocasião para bem-aventurança e relaxamento, mas um forno para queimar as nossas ilusões egoístas”.
Quando
sentamos, imóveis, para buscar a verdade interior, podemos ser assaltados
por dúvidas, ansiedades e outros movimentos da ignorância. Dessa tensão surgem
um atrito e um fogo que queimam as ilusões do nosso eu pessoal, tornando-o
digno de contemplar a verdade. Assim, a perseverança é essencial para que a
meditação produza a mudança.
3-“A
caminhada espiritual é apenas pessoal e subjetiva, nada tendo a ver com os
outros ou com o mundo externo”.
O monge zen Thich Nhat Hanh considera que “os instrutores espirituais que não dão atenção aos problemas do mundo, como fome, guerra, opressão e injustiça social, não compreenderam bem o significado do budismo mahayama.” Naturalmente devemos praticar a atenção na respiração, a meditação e o estudo das escrituras, mas qual é o sentido de fazer estas coisas? É estar atento ao que ocorre dentro de nós e no mundo. O que ocorre no mundo também ocorre dentro de nós, e vice-versa.
O monge zen Thich Nhat Hanh considera que “os instrutores espirituais que não dão atenção aos problemas do mundo, como fome, guerra, opressão e injustiça social, não compreenderam bem o significado do budismo mahayama.” Naturalmente devemos praticar a atenção na respiração, a meditação e o estudo das escrituras, mas qual é o sentido de fazer estas coisas? É estar atento ao que ocorre dentro de nós e no mundo. O que ocorre no mundo também ocorre dentro de nós, e vice-versa.
Uma
vez que vejamos isso claramente, não nos recusaremos a tomar posição ou a agir.
Se não pudermos ver o que está ocorrendo ao nosso redor, como poderemos
enxergar nossa própria natureza? Há uma relação entre a natureza do eu e a
natureza do sofrimento, da injustiça e da guerra'.
4-
“Nossos pensamentos e emoções são independentes e separados do nosso corpo
físico”.
Na
verdade, nossas emoções e pensamentos se refletem o tempo todo no modo como a
energia física e vital passa por nosso corpo. A alimentação, a respiração, a
circulação do sangue, o trabalho do rim e do fígado, os relaxamentos e tensões
são retratos dinâmicos que expressam no plano físico o que vai em nossa alma.
As posturas e processos corporais, por sua vez, tem forte influência sobre
nossas atitudes mentais e emocionais. Você pode fazer uma experiência prática e
comprovar isso neste exato momento. Faça uma pausa. Erga os braços com as mãos
fechadas, sem tensão, um pouco acima dos ombros e as leve para trás o mais
possível, sem que haja desconforto. A sua coluna vertebral ficará comodamente
ereta. Ao mesmo tempo, respire de modo
suavemente profundo. Feche os olhos, repetindo lenta e amorosamente, com meio
sorriso nos lábios, a seguinte frase: “Eu estou em sintonia com a paz do
universo”. Há uma relação direta entre a postura do tórax e os estados de
consciência.
Os
ombros abertos e a respiração profunda dão confiança em si mesmo e na vida.
Depois de alguns minutos, encerre o exercício e observe o fluxo da sua energia
vital, física, emocional e mental. Notará uma diferença.
5-“O
caminho espiritual é feito de fé e crença.”
Grave engano. A crença em algo que não podemos
verificar por nós mesmos reduz a nossa capacidade
de perceber a realidade e fecha nossa mente para o que é novo. O caminho
espiritual é feito de perguntas e tentativas. A convicção é um péssimo critério
para julgar a verdade.
Os
autoritarismos, religiosos ou não, plantam falsas certezas e exigem “fé” e
“confiança” dos seus seguidores. Os sistemas corretos de liderança, baseados na
democracia e na comunhão fraterna, fazem da transparência, do controle e da
vigilância coletiva a sua característica central.
A
verdadeira fé surge de dentro para fora, não é resultado de propaganda ou
pregação, e não tem medo do exame crítico, mas, ao contrário, testa sua própria
força enfrentando de boa vontade os desafios da vida.
Muitos
outros exemplos de ilusão podem ser encontrados na vida dentro e fora de nós.
Na verdade, o caminho espiritual é apenas o modo como cada um de nós decide,
livremente, aceitar o desmonte das suas ilusões e adequar sua vida prática à
lei eterna do equilíbrio e da verdade. A sabedoria espiritual não é um dogma em
que se deve acreditar, mas uma ciência prática a aplicar no laboratório da nossa
vida diária, à medida que a ignorância é dolorosamente reconhecida como tal.
Felizmente há uma grande bênção escondida em cada desilusão,
e um alívio maior nasce, sempre, de cada sofrimento nosso.
"A
DESILUSÃO É O ENCONTRO COM A VERDADE"
(Esse texto não é meu, mas desconheço o autor do mesmo)