segunda-feira, 16 de abril de 2012

HINO NACIONAL (CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE)

Precisamos descobrir o Brasil!
Escondido atrás as florestas,
com a água dos rios no meio,
o Brasil está dormindo, coitado.
.
Precisamos colonizar o Brasil.
O que faremos
importando francesas
muito louras,
de pele macia,
alemãs gordas,
russas nostálgicas
para garçonettes dos restaurantes noturnos.
E virão sírias fidelíssimas.
Não convém desprezar as japonesas...
.
Precisamos educar o Brasil.
Compraremos professores e livros,
assimilaremos finas culturas,
abriremos dancings
e subvencionaremos as elites.
Cada brasileiro terá sua casa
com fogão e aquecedor elétricos,
piscina,
salão para conferências científicas.
E cuidaremos do Estado Técnico.
.
Precisamos louvar o Brasil.
Não é só um país sem igual.
Nossas revoluções
são bem maiores do que quaisquer outras;
nossos erros também.
E nossas virtudes?
A terra das sublimes paixões...
os Amazonas inenarráveis...
os incríveis João-Pessoas...
.
Precisamos adorar o Brasil!
Se bem que seja difícil compreender
o que querem esses homens,
por que motivo eles se ajuntaram
e qual a razão de seus sofrimentos.
.
Precisamos,
precisamos esquecer o Brasil!
Tão majestoso,
tão sem limites,
tão despropositado,
ele quer repousar
de nossos terríveis carinhos.
.
O Brasil não nos quer!
Está farto de nós!
Nosso Brasil é no outro mundo.
Este não é o Brasil.
Nenhum Brasil existe.
E acaso existirão os brasileiros?
.
Quanto a mim,
sonharei com Portugal.
Às vezes,
quando estou triste
e há silêncio nos corredores e nas veias,
vem-me um desejo de voltar a Portugal.
Nunca lá estive, é certo,
como também é certo meu coração,
em dias tais,
ser um deserto.
.