Ouve, então, velho Patrul: Tu mesmo, indulgente distraído, que já por eras tens sido traído, hipnotizado e enganado pelas aparências. Estás ciente disto? Estás? Agora, neste mesmo instante, enquanto estás sob o feitiço da percepção equivocada tens que prestar atenção.
Não permita deixar-te levar por esta vida falsa e vazia. Tua mente está apenas girando por aí, levando em frente vários projetos inúteis: Um desperdício! Desiste! Pensar sobre as centenas de planos que desejas realizar, sem tempo suficiente para terminá-los, só aumenta o peso em tua mente. Estás completamente distraído por todos estes projetos que nunca chegam a um final, apenas permanecem aumentando, como círculos na água. Não sê tolo: por agora, apenas sente direito. Ouvindo ensinamentos - já ouvistes centenas de ensinamentos, mas quando não compreendestes o significado de um deles sequer, qual a finalidade de ouvir mais? Refletindo sobre ensinamentos - mesmo apesar de tê-los ouvido, se eles não surgem à mente quando necessários, qual é a finalidade de mais reflexão? Nenhuma. Meditando de acordo com os ensinamentos - se tua prática de meditação ainda não está curando os estados obscurecidos da mente - esqueça-a! Tu contastes quantos mantras já fizestes - mas não estás realizando a visualização "kyerim".
Podes conseguir as formas das deidades boas e claras - mas não estás colocando um fim à sujeito e objeto. Podes domar o que parecem ser espíritos do mal e fantasmas, mas não estás treinando o fluxo da tua própria mente. Tuas belas quatro sessões de prática de sadhana, tão meticulosamente distribuídas - Esqueça-as. Quando estás de bom humor, tua prática parece ter muita clareza - mas simplesmente não consegues relaxar nela. Quando estás deprimido, tua prática é estável o suficiente, mas não há brilho algum nela. Quanto à atenção, tentas forçar a ti mesmo num estado semelhante a Rigpa, como se enfiando um dardo no alvo! Quando posições ióguicas e olhares mantém tua mente estável apenas por mantê-la amarrada - Esqueça-as!
Dando palestras grandilhoqüentes, não faz nenhum bem ao teu fluxo mental. O caminho do racionalismo analítico é preciso e afiado... Mas é apenas mais ilusão, perfeita como o estrume, sem utilidade alguma. As instruções orais são muito profundas mas apenas se as colocares em prática. Lendo várias vezes estes textos do dharma que apenas ocupam tua mente e fazem teus olhos arder - Esqueça-os! Tu bates teu pequeno "damaru" - ting, ting - E a platéia acha muito bonitinho o que ouve.Estás recitando palavras sobre oferecer teu corpo, mas ainda não parastes de considerá-lo muito querido. Fazes teus pequenos címbalos soarem cling, cling - Sem manter a finalidade definitiva em mente. Todo este equipamento de prática do dharma, que parece tão atraente - Esqueça-o! Agora mesmo, aqueles estudantes todos estão estudando muito... Mas ao final, não conseguem se manter. Hoje, parecem entender, mas pouco depois, não sobra nada. Mesmo se um deles consegue aprender um pouco, raramente aplica seu "aprendizado" a sua própria conduta. Estas disciplinas elegantes do dharma - Esqueça-as! Este ano ele realmente gosta de você, no outro ano não é mais assim. A princípio, ele parece modesto, então ele fica pomposo e metido. E quanto mais tu o ajudas e pajeias, mais distante ele fica. Estes caros amigos que mostram sorrisos no começo - Esqueça-os! Seu sorriso parecia tão cheio de alegria... Mas quem sabe se seria realmente o caso? Uma vez, é puro prazer, então são nove meses de aflição mental. Pode ser ótimo por um mês, mas cedo ou tarde, surgem problemas. As pessoas fazem provocações, tua mente em conflito -Tua namorada - Esqueça-a! Estas infindáveis rodas de conversação são apenas apego e aversão -É apenas mais estrume... Não serve para nada. Na hora parece maravilhosamente divertido, mas na verdade estás apenas espalhando histórias sobre os erros de outras pessoas. Tua platéia parece estar ouvido atenta, mas então ficam com vergonha de ti. Fala inútil que apenas dá sede - Esqueça-a! Dar ensinamentos sobre textos de meditação sem tu mesmo teres atingido a experiência de fato através da prática, é como recitar um manual de dança em voz alta e pensar que é o mesmo que dançar de fato. As pessoas podem estar te ouvindo como devoção, mas simplesmente não é a coisa de fato. Cedo ou tarde, quando tuas próprias ações contradizerem os ensinamentos, sentirás vergonha. Apenas jogando palavras pela boca, dando explicações do dharma que parecem tão eloqüentes - Esqueça-as! Quando tu não tens um texto, anseias por ele... Então quando finalmente o consegue, dificilmente o examinas de fato. O número de páginas parece adequadamente pequeno, mas é um pouco difícil encontrar um tempo para copiá-las todas. Assim... Mesmo que tu copiastes todos os textos de dharma do mundo, não estarias satisfeito. Copiar textos é uma perda de tempo (A não ser que sejas pago). Então, esqueça isto! Hoje, estão felizes como ostras - Amanhã, estão furiosas. Com todos seus humores negros e brancos, as pessoas nunca estão satisfeitas. Mesmo se são realmente boas, podem não aparecer quando tu realmente precisa delas, te desapontando ainda mais. Toda essa polidez, mantendo um tratamento cortês - Esqueça-a! O trabalho mundano e religioso é a providência dos homens de bem. Patrul, velho garoto - isto não é para ti. Não percebestes o que sempre acontece? Como um velho touro, assim que tu te dás o trabalho de aborrecê-lo pelos seus serviços, parece não ter nenhum desejo restante (Exceto voltar a dormir). Sê assim - sem desejos. Apenas durma, coma, mije, cague. Não há nada além disso a ser feito na vida. Não te envolvas com outras coisas: elas não são o ponto. Mantenha-te discreto! Durma. No universo tríplice quando és menor que teu companheiro deves tomar o assento mais baixo. Caso aconteça de seres o superior ali, não te tornes arrogante. Não há necessidade alguma de ter amigos íntimos... Está melhor apenas manter-se consigo mesmo. Quando não tens nenhuma obrigação religiosa ou mundana, não permaneça ansiando adquirir alguma! Se abandonares tudo - tudo, tudo... Este é o ponto!
Este conselho foi escrito foi escrito pelo praticante Trime Lodro (Patrul Rinpoche) para seu amigo íntimo Ahu Shri (Patrul Rinpoche), de forma a um conselho exatamente sob medida para suas capacidades. Este conselho deve ser posto em prática. Mesmo que tu não saibas como praticá-lo, apenas abandone tudo - isto é o que eu realmente quero dizer. Mesmo que tu não sejas capaz de ser bem sucedido na tua prática do dharma, não fique bravo. Possa ser virtuoso.
Patrul Rinpoche (1808-1887) foi o mestre Dzogchen errante da virada do século, amado por seu povo. Ele era famoso como o vagabundo iluminado.