Não estou aqui para dar a você um dogma - o dogma faz com que se tenha certeza. Não estou aqui para dar a você nenhuma promessa para o futuro - nenhuma promessa para o futuro transmite segurança. Estou aqui apenas para deixá-lo alerta e consciente - isto é, para ficar aqui agora, com toda a insegurança que existe na vida, com toda a incerteza que existe na vida, com todo o perigo que existe na vida.
Se você veio aqui em busca de certeza, de alguma doutrina, algum "ismo", algum lugar ao qual pertencer, alguém em quem confiar. Você não encontrará nada disso aqui.
Você está aqui por causa do medo que sente. Você consegue ver esse medo? Ele é quase sempre inconsciente, e por isso muito difícil de se ver. Mas ele está aí, pode acreditar.
Eu gostaria de fazer com que você se sentisse ainda mais inseguro, mais incerto - porque é assim que a vida é, é assim que Deus é. Quando há mais insegurança e mais perigo, o único jeito de reagir aisso é apelar para a consciência.
São duas possibilidades. Ou você fecha os olhos e passa a ser dogmático, vira cristão, hindu ou muçulmano...e aí fica como se fosse um avestruz. Isso não muda a vida; é simplesmente fechar os olhos. Simplesmente faz de você um estúpido, alguém sem inteligência. E nessa tua falta de inteligência, você se sente seguro - todo idiota se sente seguro. Na verdade só os idiotas se sentem seguros. O homem que está verdadeiramente vivo sempre se sentirá inseguro. Que segurança pode existir nesse mundo?
A vida não é um processo mecânico; não pode ser predeterminada. Ela é um mistério imprevisível. Ninguém sabe o que acontecerá em seguida. Nem Deus, que você acha que mora em algum lugar no sétimo céu; nem mesmo ele - se estiver lá -, nem ele sabe o que vai acontecer!... porque, se ele sabe o que vai acontecer, então a vida é só tapeação, tudo é escrito de antemão, é determinado de antemão, um simples jogo de cartas marcadas. Como ele pode saber o que vai acontecer com você se o futuro está em aberto? Se Deus sabe o que vai acontecer daqui à pouco, então a vida é só um processo mecânico, morto. Então não existe liberdade, e como pode existir vida sem liberdade? Então não há possibilidade de crescer ou não crescer. Se tudo é predeterminado, não existe glória nem grandeza. Você é apenas um robô.
Não, nada é seguro. Essa é a minha mensagem. Nada pode ser seguro, porque uma vida segura seria pior do que a morte. Nada é certo. A vida é cheia de incertezas, cheia de surpresas - é aí que está a beleza dela! Quando disser que está certo de alguma coisa, estará simplesmente declarando a própria morte; terá se suicidado.
A vida continua em marcha, com mil e uma incertezas. É aí que está a liberdade dela. Não chame a isso de insegurança.
A liberdade dá medo. As pessoas falam sobre a liberdade, mas elas têm medo. E um homem não é um homem ainda se ele tem medo da liberdade. A vida te dá liberdade e não segurança. A vida, através da sua experiência, lhe dá entendimento; não te dá conhecimento. O conhecimento lhe traz certezas. Se posso dar a você a fórmula pronta, de que existe um Deus, existe um céu, um inferno e existem as boas e as más ações; cometa um pecado e você irá para o inferno, pratique o bem e irá para o céu - acabou!-, então você tem certezas. É por isso que tantas pessoas optaram por ser cristãos, hindus, muçulmanos, judeus - elas não querem liberdade, querem fórmulas fixas. Faça isso e acontece aquilo...
Quando a morte bater à tua porta, todas as tuas certezas serão simplesmente charadas e tolices. Não se apegue a nenhuma certeza. A vida é incerteza - sua própria natureza é incerta. E um homem inteligente nunca tem certeza de nada.
A própria disposição para permanecer na incerteza é coragem. A própria disposição para ficar na incerteza é confiança. A pessoa inteligente é a aquela que está sempre alerta, não importa a situação - e a enfrenta com todo o seu coração.
by Osho
segunda-feira, 30 de novembro de 2009
Para ser um indivíduo...
Para ser um indivíduo, é preciso o mais destemido dos treinamentos: "Não importa que o mundo inteiro esteja contra mim. O que importa é que a minha experiência é válida".
by Osho
by Osho
segunda-feira, 16 de novembro de 2009
"Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. O que confesso não tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto."
Fernando Pessoa
Fernando Pessoa
"Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos."
Fernando Pessoa
Fernando Pessoa
"Enquanto não superarmosa ânsia do amor sem limites, não podemos crescer emocionalmente. Enquanto não atravessarmos a dor de nossa própria solidão, continuaremos a nos buscar em outras metades. Para viver a dois, antes, é necessário ser único."
Fernando Pessoa
Fernando Pessoa
sexta-feira, 13 de novembro de 2009
Tabacaria
Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira.
Em que hei de pensar?
Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso?
Mas penso tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Gênio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando?
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;
Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
O seu sol, a sua chava, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
as acordamos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.
(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.
(Tu que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)
Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente
Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
vou escrever esta história para provar que sou sublime.
Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.
Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,
Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.
Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.
Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.
(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.
Álvaro de Campos, 15-1-1928
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira.
Em que hei de pensar?
Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso?
Mas penso tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Gênio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando?
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;
Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
O seu sol, a sua chava, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
as acordamos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.
(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.
(Tu que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)
Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente
Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
vou escrever esta história para provar que sou sublime.
Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.
Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,
Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.
Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.
Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.
(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.
Álvaro de Campos, 15-1-1928
segunda-feira, 2 de novembro de 2009
ACORDA!
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO TODA LEITURA NAO MAIS TE ENTRETER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO TODA RELIGIÃO NÃO MAIS TE ENTORPECER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO TODA FORMA DE BUSCA NÃO TE SATISFAZER?...
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO A MEDIOCRIDADE DAS CONVERSAS TE ABORRECER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO O "SCRIPT" SOCIAL NÃO MAIS TE CORRESPONDER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO TODA NOVIDADE NÃO TE DER PRAZER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER?
QUANDO OS TEUS MAIS QUERIDOS NÃO TE COMPREENDEREM?...
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO A SEGURANÇA DO VELHO NÃO TE REJUVENESCER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER?
QUANDO A FILIAÇÃO EM UM GRUPO NÃO TE PROTEGER?
E O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO BATER NA PORTA E NINGUÉM TE RESPONDER?...
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO PERCEBER SER FALSA A SEGURANÇA QUE VOCÊ PENSAVA TER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO CONQUISTAR TUDO QUE PENSAVA NECESSÁRIO TER?
E O QUE VAI FAZER
QUANDO O DESFRUTAR DO SEU TUDO NÃO TER PRAZER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER?
ESPERAR PELA GRAÇA
CAPAZ DE TRAZER GRAÇA
POR TUDO QUE ESTIVER SEM GRAÇA?
"Apenas somos quando em nada nos tornamos. É quando perdemos nossas pernas que nos tornamos corredores".
(Jalal ud-Din Rumi)
QUANDO TODA LEITURA NAO MAIS TE ENTRETER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO TODA RELIGIÃO NÃO MAIS TE ENTORPECER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO TODA FORMA DE BUSCA NÃO TE SATISFAZER?...
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO A MEDIOCRIDADE DAS CONVERSAS TE ABORRECER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO O "SCRIPT" SOCIAL NÃO MAIS TE CORRESPONDER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO TODA NOVIDADE NÃO TE DER PRAZER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER?
QUANDO OS TEUS MAIS QUERIDOS NÃO TE COMPREENDEREM?...
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO A SEGURANÇA DO VELHO NÃO TE REJUVENESCER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER?
QUANDO A FILIAÇÃO EM UM GRUPO NÃO TE PROTEGER?
E O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO BATER NA PORTA E NINGUÉM TE RESPONDER?...
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO PERCEBER SER FALSA A SEGURANÇA QUE VOCÊ PENSAVA TER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER
QUANDO CONQUISTAR TUDO QUE PENSAVA NECESSÁRIO TER?
E O QUE VAI FAZER
QUANDO O DESFRUTAR DO SEU TUDO NÃO TER PRAZER?
O QUE VOCÊ VAI FAZER?
ESPERAR PELA GRAÇA
CAPAZ DE TRAZER GRAÇA
POR TUDO QUE ESTIVER SEM GRAÇA?
"Apenas somos quando em nada nos tornamos. É quando perdemos nossas pernas que nos tornamos corredores".
(Jalal ud-Din Rumi)
Para entender a pobreza
“Pensamentos de falta (escassez) causam medo; o medo nos leva a acordos, e acordos nos conduzem ao sacrifício. Por exemplo, o medo pode nos levar a ver a aparência de insegurança financeira, ou de amor. Sentindo o medo da falta como real, nosso ego aparecerá com uma barganha e nos diz – convincente, mas mentiroso – que podemos trabalhar em condições adversas para reconquistar uma segurança financeira. É assim que o ego mantém seu círculo do medo, fazendo-nos ver a falta onde, em realidade, há abundância do que é Real.”
(“Leve-me à Verdade – Desfazendo o Ego” – N.Sanchez e T. Vieira, Tradução de Maria Theraza de Barros Camargo”, Íbis Libris Editora, 2008)
(“Leve-me à Verdade – Desfazendo o Ego” – N.Sanchez e T. Vieira, Tradução de Maria Theraza de Barros Camargo”, Íbis Libris Editora, 2008)
PARA TI QUE VIVES APRISIONADO NO MEDO DE SER
Que fique esclarecido, que não procuro afastar-te da tua religião, que desistas de seres a tua profissão, que desistas de todas as idéias e ideais que tens sobre a vida, o amor, deus; não procuro nem espero que faças algo que vai de encontro ao sentir do teu Ser.
Apenas procuro chocalhar as águas estagnadas e podres que existem em ti, procuro quebrar a barragem que acumula a água que devia alimentar o rio da tua vida, mas que não o fazes e se o fazes, fá-lo a conta-gotas, por isso há partes de ti que secaram e mirraram, a vegetação luxuriante e viçosa das margens do rio desapareceu.
Só as águas correntes é que são boas para beber, e elas acontecem em rios, fontes e cascatas, nunca em pântanos, nem em lagos, nem em barragens, nestes a água está parada, é no movimento e na agitação da água, que ela se oxigena e que ganha os elementos químicos que vão alimentar plantas e animais.
Que a nossa vida seja como um rio, que não interessa para onde corre, desde que sintamos que a nascente seja a verdadeira nascente da energia criadora que existe em nós, mas que muitas vezes a negamos, quando somos formatados por uma sociedade ou religião, e nos dizem que não temos Poder, que somos pecadores e devemos sacrifícios.
A Liberdade vem dessa Vida agitada e em movimento através da emoção e da ação. Somos intrinsecamente Amor, Vida, Deus, e Liberdade, Alegria, Verdade. E quem nos diz que não somos isto, está mentindo, e quando acreditamos nesses alguéns, seguimos os seus caminhos tortuosos de dogmas, leis, cânones, regulamentos, começamos a secar e a acumular e paramos. Mesmo vivendo estamos mortos.
Quebrem as vossas barragens, dispersem a vossa energia, é na entrega que recebem, e recebendo a devolvem novamente à origem.
Apenas procuro chocalhar as águas estagnadas e podres que existem em ti, procuro quebrar a barragem que acumula a água que devia alimentar o rio da tua vida, mas que não o fazes e se o fazes, fá-lo a conta-gotas, por isso há partes de ti que secaram e mirraram, a vegetação luxuriante e viçosa das margens do rio desapareceu.
Só as águas correntes é que são boas para beber, e elas acontecem em rios, fontes e cascatas, nunca em pântanos, nem em lagos, nem em barragens, nestes a água está parada, é no movimento e na agitação da água, que ela se oxigena e que ganha os elementos químicos que vão alimentar plantas e animais.
Que a nossa vida seja como um rio, que não interessa para onde corre, desde que sintamos que a nascente seja a verdadeira nascente da energia criadora que existe em nós, mas que muitas vezes a negamos, quando somos formatados por uma sociedade ou religião, e nos dizem que não temos Poder, que somos pecadores e devemos sacrifícios.
A Liberdade vem dessa Vida agitada e em movimento através da emoção e da ação. Somos intrinsecamente Amor, Vida, Deus, e Liberdade, Alegria, Verdade. E quem nos diz que não somos isto, está mentindo, e quando acreditamos nesses alguéns, seguimos os seus caminhos tortuosos de dogmas, leis, cânones, regulamentos, começamos a secar e a acumular e paramos. Mesmo vivendo estamos mortos.
Quebrem as vossas barragens, dispersem a vossa energia, é na entrega que recebem, e recebendo a devolvem novamente à origem.
Santo sou eu...
"Santo sou eu. Pelo Amor criado e, pelo Amor sustentado. Pois nunca deixei os Braços Eternos. Estou perturbado por sonhos de pecado, e presságios funestos parecem roubar minha paz, e me deixar preso ao terror e a um destino maligno. No entanto, minha santidade permanece intocada, Como Deus a criou. Pois não pode haver Pecado em Deus, e, portanto, nem em mim."
(As Dádivas de Deus, p. 28)
(As Dádivas de Deus, p. 28)
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